sábado, 22 de dezembro de 2007

O MENTIRISTA

“As verdades são mentais ou nominais, conforme a espécie dos sinais. As mentiras são fatais” (Leibnitz)
Sempre se buscou a verdade, mas não se inventou a mentira. A mentira não teve um criador, mas seus devotos cumprem a fidelidade máxima. A mentira começou com o não dizer, a omissão conspiratória, o silêncio estratégico. Todo mentiroso é um encenador de si mesmo e, concentrado no personagem, tropeça nas relações humanas. Por isso ele não olha nos olhos. Por isso ele atira a primeira pedra. Mas não façamos escárnio da mentira, pobre coitada. Não sentaremos no próprio traseiro para vilipendiar o caráter alheio. É bem verdade que “o inferno são os outros”, como queria Sartre, mas desancar o mentiroso e dá luz ao verdadeiro é lubrificar o tecido social.
Veio vindo. Mentira aqui, mentirinha ali, blefe acolá. Mudanças de idioma, ignorância, ciúme, mesquinhez, má-fé. Várias categorias sociais se estabeleceram em forma de blefadores. Mentem reis, mentem soldados. Mente o clero, mentem os cunhados. Vários defensores da verdade foram martirizados. Viraram profetas, livros, filmes e imagens. Tudo em nome do bem comum e do interesse universal. Mas, das categorias que souberam utilizar da mentira em proveito próprio, três se destacam: os economistas, os publicitários e os políticos. Devemos parabenizá-los e honra-los neste primeiro de abril, conferindo-lhes alguns troféus emblemáticos.
CASA DE FERREIRO, ESPETO DE PAU
Máquina de gerar conflitos, de sobrepor fatos e inibir os puritanos. A mentira cai como uma luva na sanha desses caçadores de almas. Primeiro acreditam demais em si mesmos. Ouvem o que não querem para fazer o que querem. Atiram-se no baralho social como se fosse uma cama de faquir: sacrificados e sacrificantes. Posta a farsa, danam a falar e a fazer bobagens criando fissuras. Sendo homens públicos, eis o perigo: debocham do imaginário popular com seu discurso impávido e oco.
TROFÉU: ADULAR O DÓLAR (Para economistas)
Os economistas (e não as donas de casa) são quem regem as questões sanitárias e alimentares do país sem passar na porta de supermercados ou farmácias. A eles, os carniceiros modernos, deveriam ser oferecidas as batatas e um anel de São Cipriano, com todo respeito ao santo.
TROFÉU: ORIGINAL FOI QUEM PLAGIOU PRIMEIRO (Para publicitários)
Os publicitários, essas pérolas travestidas de futuristas, deveriam ser premiados com abacaxis coroados, circundados de três tomates. Explicamos: o primeiro tomate representa a diplomacia internacional; o segundo tomate simboliza uma bala perdida e o terceiro, seria a representação do cérebro de Freud – o pai de todos os recalcados.
TROFÉU: JURO E DESCONFURO (Para políticos)
Aos políticos deveríamos dar um abraço fraterno, afinal estamos comemorando a mentira! Devíamos sugerir-lhes que voltassem para seus lares e dedicassem mais tempo aos cônjuges e aos filhos. Evitando-lhes o constrangimento de gastar o sonho alheio com as suas particularidades hediondas. E a eles, num sentido original, deveriam ser dado um troféu de três pedras. A pedra maior, moldada em quartzo, simbolizaria a pedra com a qual Caim matou Abel. O calcário representaria os velórios e as missas de sétimo dia obrigatórias. E uma terceira pedra diminuta, de sal, simbolizaria um eleitor rural, analfabeto, diante de um aparelho de TV ouvindo promessas. Mentiras sinceras?
POETAS E ATLETAS NÃO PODEM MENTIR
“Ame ou não, ó amada
Seja sempre boa atriz.
Fingir amor não custa nada
Custa muito é ser feliz.” (Apolônio Hilst)
Poder podem, não devem. Aconselha-se não faze-lo com o risco de pagar um custo altíssimo ao ver descer à Mansão dos Mortos, toda sua obra e inspiração. Toda a sua técnica e dedicação. Foi Godard quem sugeriu isto. Um atleta nunca pode prometer marcas que ele não pode cumprir, cronômetros e pódios são infalíveis. A cabeça não agüenta, o corpo é que paga. O corpo é quem apaga. E a mentira requentada vira verdade de perfumaria. Fica o dito pelo não dito. Botar o caráter no bolso e sair por aí tangenciando. Alguns se desvencilhando das pedras no caminho, outros escondendo atrás das mesmas pedras, esperando ansiosamente a oportunidade de atacar outra vez. Mesmo a mentira tendo pernas curtas e as mãos quebradas, eles correm o risco. Vazio, o mentirista é, antes de tudo, um nada.

Texto produzido a quatro mãos pelos poetas Wagner Vieira e Osmir Camilo do grupo LESMA ‑ Liga Eco-cultural Santa Matilde ‑ da Cidade de Conselheiro Lafaiete – antiga Queluz de Minas ‑ na região Central de Minas Gerais

Almanhaque do Barão de Itararé


Filosofias do Barão de Itararé

* “Os homens sãoi de duas categorias:
os solteiros e os loucos”.
* Negociata é um bom negócio para o qual não fomos convidados”.

* “Há mudos tão inteligentes que nem querem aprender a falar”.

* “O avarento quando morre deixa tudo, porque não pode levar”

* “A lágrima é o suor do coração”.

Barão de Itararé
Aparício Torely (1895-1972), o Barão de Itaraé

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